Estudando a contrainsurgência dos Estados Unidos

— 11 — liberdades como mulher estão sendo recortadas e sua dignidade lesada. Trump soube captar tudo isso. Vindo de uma família rica que havia feito fortuna com especulação imobiliária, representa uma expressão capitalista fincada primordialmente no território nacional, uma fração da burguesia que não está, como nos casos de Clinton ou Obama, relacionada estreitamente com a transnaciona- lidade do capital. O simpatizante de Trump faz parte dessa população amorfa de cidadãos descrita por Morris Berman em seu livro Edad oscura americana: la fase final del imperio (2008), marcada pela religiosi- dade centrada na fé na providência e pelo fundamentalismo: a igno- rância ignorada, não reconhecida (a pior de todas); os preconceitos racistas e a crença em uma hierarquia racial; produto da atrofia do sistema educativo e do pensamento crítico e racional; o individua- lismo exacerbado e o patriotismo baseado nas ideias de destino ma- nifesto e na visão dicotômica do mundo, dividido entre bons e maus, perdedores e ganhadores. Características que, reunidas e intensifi - cadas em conjunturas eleitorais, conformam um terreno fértil para demagogos como Trump, que expressam de maneira pública, ainda mais agora como presidente, as ideias que essa população mantém subterraneamente. É muito prematuro pensar que Trump marca uma mudança de época ou, como afirmam alguns analistas, como Álvaro Garcia Linera, o fimda globalização transnacional. É precisomatizar tais considera - ções. Os obstáculos jurídicos e políticos para a aplicação de algumas de suas promessas eleitorais devem ser considerados, assim como as várias resistências de setores importantes do povo estadunidense e da própria elite política derrotada. Mas podemos, sim, ter segurança de que a era Trump estámarcada pelas graves crises políticas, econô - micas e sociais que temos observado nesses anos. De acordo com William Robinson, a globalização econômica tem sua contrapartida na formação transnacional de classes e na